A floresta encantada

A Laurissilva é Património Mundial desde 1999, mas existe na Madeira há 5 milhões de anos e é única no Mundo.

 

O ambiente é exótico, com árvores que fazem lembrar os dinossauros, ou um paraíso intocado. A vegetação é densa, exuberante, com um toque quase tropical. Não falta a água abundante, nem um nevoeiro ocasional para adensar o mistério.

Este cenário é uma inspiração para os artistas e um desafio à imaginação. É quase como se a qualquer momento um duende ou uma fada fossem sair de trás de uma árvore, ou surgir numa curva do caminho.

Este não é o cenário de um filme, mas podia ser! É a realidade da Laurissilva, a floresta endémica da Madeira, que a UNESCO distinguiu como Património Mundial Natural da Humanidade há 15 anos. Esta floresta é única no Mundo. Resistiu à era glaciar e a 600 anos de presença humana. Nos Açores e nas Canárias existem alguns focos, mas é na Madeira que ela é mais exuberante e ocupa uma área de 15 mil hectares.

Hoje em dia esta floresta continua a viver paredes-meias com o Homem. É vital no controlo ambiental da ilha e ajuda a garantir o clima temperado. Também é importante na captação de água, através da humidade e da precipitação.

Além do importante papel ambiental, é também uma forte atracção turística. Toda a sua área, protegida por leis nacionais e internacionais, é um estímulo à descoberta de paisagens luxuriantes, trilhos que serpenteiam as montanhas, ou cursos de água que correm em desfiladeiros, com quedas de água abruptas e pequenas lagoas únicas.

Um estudo Turismo da Madeira coloca a Natureza no topo das preferências dos turistas que visitam a ilha. É certo que a Laurissilva é apenas uma das componentes da Natureza da Madeira, mas esta floresta desempenha um papel importante na captação de visitantes.

Todos os dias centenas de pessoas percorrem os cerca de 40 trilhos recomendados, alguns dos quais seguem o curso de levadas, que são canais de transporte de água. As caminhadas são a forma mais popular e mais simples de mergulhar na floresta. Outra é através canyoning, uma actividade que implica descer por cursos de água com a ajuda de material de escalada.

A observação de aves é outra das actividades muito comuns. Na Laurissilva vivem espécies únicas com o Pombo-trocaz ou o Bis-bis, ou bastante invulgares como o Tentilhão, o Merlo-preto, ou a Lavandeira. Também existem aves de rapina e até a Coruja-das-torres.

A flora é dominada por árvores endémicas que pertencem à família das lauráceas, daí o nome da floresta, que quer dizer floresta das lauráceas. Algumas das grandes árvores são anteriores à descoberta da ilha.

Uma floresta não vive apenas de grandes árvores. No caso da Laurissilva há também fetos, orquídeas, gramíneas, arbustos, ervas e centenas de outras espécies de escaravelhos, borboletas, formigas, caracóis... É o conjunto de todas as espécies animais e acima de tudo a dinâmica que se cria no ecossistema, que faz a vitalidade da floresta.

É um apelo aos sentidos: com uma paisagem que tranquiliza a visão; com o som das aves e dos marulhar das águas; com os aromas das plantas como o loureiro, ou da terra húmida; o sabor dos frutos silvestres, ou da frescura da água; e as texturas dos musgos e troncos das árvores centenárias.

A Laurissilva tem inspirado artistas de várias formas. A dupla madeirense de fotógrafos DDiarte tem escolhido por diversas vezes cenários da floresta para as suas artísticas produções fotográficas digitais, premiadas internacionalmente. Essas imagens têm contribuído para a imagem da Laurissilva como floresta encantada. Várias outras manifestações artísticas têm escolhido este cenário, desde curtas-metragens, videoclips e até concertos.

A ilha tem vários outros ecossistemas, como a vegetação de altitude ou áreas florestais com espécies introduzidas. Mas a Laurissilva é fácil de identificar pela sua exuberância e densidade. A maior parte da sua distribuição é na costa Norte da Madeira, em Santana, São Vicente e Porto Moniz.

Em Santana vale a pena visitar o Parque Florestal das Queimadas, onde a Laurissilva foi transformada pelo Homem numa espécie de jardim encantado. Mas outros locais merecem visita, como o Chão da Ribeira do Seixal, ou o Fanal. Em particular este último parece saído de uma pintura romântica, com os seus Tis centenários, muito anteriores à presença humana na ilha.

Um outro local onde a Laurissilva pode ser apreciada é o Ribeiro Frio. É de fácil acesso e tem a particularidade de ali existir um percurso interpretativo com placas que identificam várias espécies. A ideia é juntar o factor agradável de um passeio à informação organizada sobre as espécies. Todos os dias o Ribeiro Frio é visitado por centenas de pessoas. Esta é uma forma de dar a conhecer, de um modo simples, algumas das espécies mais importantes, em apenas 500 metros.

Inicialmente esta floresta ocupava toda a bacia do Mediterrâneo, Sul da Europa e Norte de África. Nessa altura o clima no planeta era diferente, permitindo que estas espécies se estendessem para latitudes mais a Norte.

Mas as glaciações do início do Quaternário provocariam alterações no clima que seriam fatais. A descida da temperatura levou a Laurissilva quase à extinção na Europa Continental. Desse tempo restam algumas espécies, relíquias de uma presença outrora exuberante, que sobrevivem entre comunidades florestais diferentes. Na Madeira, devido à latitude mais a sul, a floresta resistiu ao gelo e sobreviveu até aos dias de hoje.